Depois de passar na manhã dessa terça-feira (18) pela Comissão de Assuntos Econômicos (CAE), o projeto que cria novas regras para contratos de seguro foi aprovado pelo Plenário do Senado e retorna à Câmara dos Deputados. Conhecida como Marco Legal dos Seguros, a proposta (PLC 29/2017) tem o objetivo de modernizar e aprimorar as regras de contratos de seguros, para conferir mais segurança jurídica às transações. O projeto proíbe o cancelamento unilateral do contrato pela seguradora.
Além disso, o texto prevê a criação de um questionário de avaliação de risco, que deverá ser preenchido na contratação do seguro, e a permissão para resolução de conflitos em foros da Justiça de todo o país, não só no local de sede da seguradora.
Baseado em um projeto que tramita há mais de 20 anos no Congresso (PL 3.555/2004), o PLC 29/2017, da Câmara dos Deputados, recebeu parecer favorável do relator, senador Otto Alencar (PSD-BA). Ele acatou texto alternativo do senador Jader Barbalho (MDB-PA) apresentado na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ), com emendas, substituindo o projeto dos deputados.
Na análise em Plenário, Otto rejeitou duas emendas apresentadas, entre elas um pedido de supressão das regras sobre resseguro, que é o seguro das seguradoras. Autor de uma emenda sobre o tema, o senador Carlos Portinho (PL-RJ) apontou que a atual redação criaria uma reserva de mercado para resseguradoras instaladas no Brasil, o que encareceria o preço dos seguros.
"A maioria das empresas de resseguro estão fora do país. O Brasil não é uma ilha. Os contratos de resseguro envolvem empresas internacionais. Na hora que quiser aplicar a legislação brasileira para esse mercado, a gente vai afastar do nosso mercado essa empresa e isso vai encarecer o produto", disse.
Na mesma linha, o senador Rogerio Marinho (PL-RN) afirmou que o projeto é positivo por modernizar a legislação de seguros, mas criticou a regulamentação do resseguro.
"A questão do resseguro já está contemplado em legislação própria. Não estamos contra empresas nacionais. Se restringirmos o nosso mercado, o preço do seguro vai aumentar", afirmou.
O relator negou qualquer tipo de reserva de mercado. A proposta, afirmou o senador, apenas exige que as empresas estrangeiras se submetam à legislação brasileira.
"O que pretende essa lei é que as empresas resseguradoras de outros países sejam submetidas à legislação nacional. O mercado é aberto. Que venham as seguradoras e se instalem aqui", disse Otto Alencar.
O líder do governo, Jaques Wagner (PT-BA), reforçou que todas as empresas são bem-vindas ao país:
"Não vejo sentido em alguém que não tem sede aqui, mas que pode fazer o resseguro aqui que queira usar como balizamento a legislação de seus país de origem. Não acho que o projeto vai afugentar ninguém. O mercado brasileiro é um mercado importante e as empresas que quiserem se instalar aqui são bem-vinda", avaliou.
Entre as medidas mais importantes, está a proibição de extinção unilateral do contrato pela seguradora. Hoje existe apenas o entendimento da Justiça de que é abusivo o cancelamento unilateral do contrato de seguro.
De forma geral, a proposta altera dispositivos do Código Civil (Lei 10.406, de 2002) para regular o mercado de seguros privados, abrangendo todas as negociações que envolvam consumidores, corretores, seguradoras e órgãos reguladores. Trata ainda de princípios, regras, carências, prazos, prescrição, normas específicas para seguro individual ou coletivo e outros temas relacionados ao seguro privado.
Conforme o texto, a lei nacional não será aplicada a seguros contratados por brasileiros no exterior nos casos já previstos na Lei Complementar 126, de 2007: cobertura de riscos para os quais não exista oferta de seguro no país; cobertura de riscos no exterior para o período em que o segurado se encontrar no exterior; e seguros que sejam objeto de acordos internacionais referendados pelo Congresso Nacional.
Fora isso, o projeto torna exclusiva a aplicação da lei brasileira à regência de todos os contratos firmados por seguradora autorizada a operar no Brasil, mesmo que a seguradora esteja fora do país. Também serão aplicadas as normas nacionais quando o segurado tiver residência no país e quando os bens garantidos estiverem no Brasil.
Hoje existe controvérsia sobre qual foro é competente para julgar e analisar litígios: se o que está na região do segurado, que pode ser em qualquer lugar do país, ou o que está na região da seguradora, cuja sede é sempre a mesma.
Pelo texto, o foro competente para as ações de seguro é o do domicílio do segurado ou do beneficiário, salvo se eles pedirem para ser no domicílio da seguradora.
O projeto prevê a elaboração de um questionário para avaliar os riscos no momento da contratação do seguro. Dessa forma, a seguradora só poderá alegar que houve omissão por parte do segurado caso ele tenha deixado de dar alguma informação, desde que tenha sido questionado.
O questionário também servirá como base para uma eventual perda da indenização pelo cliente por agravamento de risco. Portanto, caso seja comprovada a intenção do segurado de aumentar as chances de sinistro, o cenário será comparado com o conteúdo das respostas do questionário.
Também foi aumentado o prazo para a recusa da proposta pela seguradora para 25 dias, em vez dos 15 dias anteriormente previstos pelo texto original. Já em relação aos seguros de pessoas, houve alteração do prazo da carência legal de dois anos para sinistros decorrentes de suicídio, mantendo a disciplina atual do Código Civil, diferente da versão anterior do PLC, na qual o prazo estava em um ano.
Pelo texto, o segurado deve comunicar à seguradora o agravamento de um risco tão logo tome conhecimento. Depois de ciente, a seguradora terá o prazo máximo de 20 dias para adequar o contrato. Hoje a legislação estabelece prazo de até 15 dias. Se o segurado descumprir propositalmente esse dever, perderá a garantia.
Em relação aos prêmios de seguro, o projeto veda o recebimento antecipado, evitando abusos e tornando certo que a seguradora apenas possa receber e reter prêmios de operações que tenha realizado.
A seguradora terá até 30 dias para o pagamento dos sinistros e, caso precise de alguma documentação complementar para liberar o pagamento, terá 5 dias para solicitar a apresentação ao segurado. Esses dias serão subtraídos do prazo para o pagamento, que passa a ser de 25 dias.
Porém, o prazo ficará suspenso até que os documentos sejam apresentados, e será retomado a partir da formalização da entrega. Se o prazo expirar, a organização terá de arcar com juros, e o valor a ser pago será corrigido.
A nova versão do projeto prevê a possibilidade de autorização da autoridade regulatória para isentar a responsabilidade da seguradora cedente no caso de cessão de carteira, situação em que uma seguradora repassa seus contratos vigentes para outra companhia, afastando a necessidade de concordância prévia dos segurados e beneficiários.
Quando há cessão de carteira atualmente, a seguradora cedente segue respondendo pelos contratos mesmo após o repasse deles a outra companhia. A seguradora que ceder sua posição contratual (cedente), no todo ou em parte, sem concordância prévia dos segurados e seus beneficiários conhecidos ou autorização prévia e específica da autoridade fiscalizadora, será solidariamente responsável com a seguradora cessionária.
O projeto propõe um aumento no prazo para aceitação tácita de uma proposta de seguro, de 15 para 25 dias, dando mais tempo à companhia para analisar se vai aceitar ou recusar uma solicitação. Somente se passar de 25 dias, a proposta será considerada aceita.
Ainda segundo o PLC 29/2017, a proposta feita pelo segurado não exigirá forma escrita em papel, o que permitirá meios digitais para a formalização do contrato — prática que já vem sendo usada pelas empresas de seguro.
O texto prevê ainda alteração na vigência do prazo prescricional, ou seja, o intervalo de tempo em que um cliente pode entrar na Justiça contra uma seguradora. Atualmente, o prazo começa a contar a partir da data do sinistro, mas o projeto prevê a mudança para a data da negativa dada pela companhia.
Pelo texto, ocorre cosseguro quando duas ou mais seguradoras, por acordo expresso entre si e o segurado ou o estipulante, garantem o mesmo interesse contra o mesmo risco, ao mesmo tempo, cada uma delas assumindo uma cota de garantia.
O seguro cumulativo, por sua vez, é quando a distribuição entre várias seguradoras for feita pelo segurado ou estipulante por força de contratações independentes, sem limitação a uma cota de garantia.
Se a seguradora, ciente do sinistro, não identificar beneficiário ou dependente do segurado para receber o seguro, o valor passará ao Fundo Nacional para Calamidades Públicas, Proteção e Defesa Civil (Funcap) depois de cinco anos. A medida foi aprovada após destaque apresentado pelo senador Carlos Viana (PL-MG).
"Há um limbo na legislação brasileira sobre esse assunto. Quando não há a quem pagar, fica para a seguradora. Agora vai ao fundo", disse.
O relator inclui também a previsão de que o contrato celebrado sem que o proponente tenha sido informado previamente sobre o conteúdo será regido pelas condições contratuais previstas nos modelos que vierem a ser depositados pela seguradora no órgão fiscalizador de seguros, para o ramo e a modalidade de garantia constantes da proposta.
Fonte: https://www12.senado.leg.br/noticias/materias/2024/06/18/senado-aprova-marco-legal-dos-seguros